Equador foi uma grata surpresa. Em primeiro lugar porque encontrei um país muito, mas muito mais desenvolvido, bonito e organizado do que eu imaginava. Por sinal é um país muito do ajeitado.Ninguém fala do Equador ! A minha imagem de subdesenvolvimento se deve principalmente, lógico, à ignorância. Mas também a alguns preconceitos do nosso imaginário do que é desenvolvimento. Por exemplo: a moeda é o dolar. Eles dolarizaram a economia como "solução" para a super-inflação. Raciocínio: só pode ser uma paizinho merda, que não se dá ao respeito nem de manter a própria moeda, o Estado deve ser quase inexistente epresença do Estado na vida cotidiana. As cidades são super organizadas, no que diz respeito ao trânsito e aos cuidados urbanísticos. Todas as ruas têm placas com os nomes. Há sinalização por todos os lados. As calcadas, praças, jardins, canteiros são super bem cuidados.Tudo bonitinho. Dá pra ver que tem controle urbanístico: os prédios são mais ou menos todos do mesmo tamanho e tem certa harmonia. Em Quito, por sinal, a harmonia da arquitetura é um show. Todos prédios coloniais de três ou quatro andares, com sacadas no segundo andar, cores vivas, vasos de flores e telhados graciosos. Todos mais ou menos parecidos, nenhum excepcionalmente bonito. E são muitos. Preenchem todo o centro (antigo) da cidade. É por essa quantidade e harmonia que a cidade é bonita - é mesmo motivo que aumenta a graça de Paris.
É verdade que escrevo sobre um país que "conheci" em 4 dias e o pior é que saí com a impressão de ter entendido as coisas. Deve ser por isso que o Levi-Staruss diz que odeia as viagens e os viajantes, que, como eu, dão palpites sobre o que pensaram ter descoberto. Mas e daí, o grande barato da antropologia não vem, exatamente do valor da experiência particular ? Estado, descobri um belo país, totalmente desconhecido, que tem paisagens lindas nas montanhas, com muito verde, terras cultivadas e uma vegetação exuberante, como se a floresta amazônica tivesse se adaptado às altas montanhas. Nas cidades também há plantas para todos os lados e não são nada discretas. Se uma praça tem um jardim, o governo uma zona. Ledo engano! Até agora é o país que vi onde se nota a maior pode ter certeza que terá palmeiras majestosas, folhagens enormes, transbordando dos canteiros. E fazem um contraste interessante com a delicadeza da arquitetura.
Mas não é só o estado que é "desenvolvido". O país parece bem mais rico do que os anteriores (Peru e Bolívia). Têm casas bonitas, lojas mais de luxo, shopings, carroes, etc. E o contraste com a parte pobre me pareceu menor também - nesse caso o fato de ter ficado só 4 dias pode ser fatal - mas deu pra saber que muita gente sai do Peru para trabalhar e estudar no Equador. De quebra, Quito é uma cidade super animada, com um night fervilhante até mesmo ma terça-feira. Fiquei com a maior vontade de conhecer o litoral, que deve ser interessante.
Mas o que quer dizer desenvolvido? Não vou repetir o discurso que todo mundo já sabe ou devia saber da "crítica ao desenvolvimento" (com a qual concordo). Mas o que me chamou a atenção foram duas impressões contraditórias, mas que para mim, ambas fazem o mesmo sentido. A primeira impressão é de que, contra tudo o que sempre pensei, é possível que realmente haja uma espécie de caminho ou contínum que vai do menos ao mais desenvolvido. Acho que isso foi obra da globalização. Quase que "fatalmente" maior inserção nos circuitos globais corresponde a maior abundância e a níveis de vida mais confortáveis. Estar de fora dessa marcha é estar condenado a um monte de ausências ou carências - como a Bolívia. (essa é a sentença neo-liberal) A outra impressão (que nesse caso é também um pensamento) é de como é tolo acreditar que os fatores aspectos que consideramos como compondo uma sociedade desenvolvida possam ser universais ou mesmo que possam ser perfeitamente distinguidos e nominados. Que absurdo pensar que ter praças bonitinhas é um fator de desenvolvimento. Acho os jardins ingleses horríveis e não é por isso que acho a Inglaterra um país subdesenvolvido (por ser uma monarquia, usar um sistema métrico baseado nos dedos de um tirano filho da puta, dirigir pelo lado errado da rua, não ter um sistema público de saúde descente, sim). Comentários a parte, os ônibus serem umas latas velhas, o governo quase inexistente ou mesmo salários a um nível muito baixo, não são, necessariamente provas de subdesenvolvimento. Os peruanos chama de ótimos alguns ônibus que para mim são uma vergonha, embora os mesmos peruanos andem em carros muito melhores que o meu (e certamente chamariam o bom e velho escot de lata velha - uma injustiça). De alguma forma, cada um escolhe o que considera ou não importante.
O mais interessante é que esses dois pontos de vista não precisam ser, necessariamente, contraditórios (a não ser, é claro, se alguém quiser tirar as consequências ideológicas que os neo-liberais gostam de tirar da primeira parte). Na verdade, eles são simultâneos na vida. E esse é um grande barato da América Latina. Essa aparente contradição desordenada que funciona direitinho, apesar de todas as provas em contrário.